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A História de Nina Gruntkowski

NINA E O CHÁ DA INOVAÇÃO
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PLANTAR UMA NOVA IDEIA

Chamaram-lhe louca por querer produzir chá verde no Litoral Norte de Portugal.

Hoje, tem 12 mil plantas a formar as raízes da Chá Camélia.

“O CHÁ SEMPRE ME ACOMPANHOU”

Nina Gruntkowski, ex-jornalista nascida em Frankfurt, na Alemanha, já em criança trocava a escola por pequenos “momentos de chá” com as amigas. “Tinha uma que vivia perto da escola e às vezes faltávamos às aulas para beber chá em casa dela”, conta, sem conter o riso. “E as primeiras viagens que fiz como jovem, sozinha, foi para sítios onde há boas lojas, para conhecer novas qualidades e comprar.” Primeiro dentro da Alemanha, depois Londres, no Reino Unido, depois Austrália, onde, quase sem querer, foi parar ao coração do Daintree Tea. “O chá sempre me acompanhou e teve um papel muito importante na minha vida.”

“VAMOS PRODUZIR CHÁ, QUE FIXE!”

Uma vez, quando estava a entrevistar um especialista suíço e escutou que a planta e chá é uma espécie da camélia, a Camellia sinensis, quase arruinou a gravação, tamanho era o entusiasmo. Afinal, ela vivia nas “terra das camélias”, no litoral norte de Portugal, e maravilhava-se com aquela árvore que dava “flores lindas no Inverno” Saiu desse encontro com uma planta debaixo do braço e, já em casa, a reacção do marido, Dirk Niepoort, conhecido pelos vinhos mas também ele um amante de chá, não se fez esperar: “Vamos plantar chá, que fixe!” Assim foi. Escolheram o canto mais frio do jardim da casa do Porto para a experiência — e correu bem. A planta, ainda que de uma espécie diferente das comuns japoneiras minhotas, cresceu, viçosa, e “ficou o bichinho” — “produzir chá, porque não?”.

O PRIMEIRO CHOQUE

Estamos no terreno onde estão as plantas mais jovens, algumas pouco ultrapassam a altura dos tornozelos — só daqui a cinco anos, pelo menos, se tornarão chá. Esse foi o “primeiro choque”, diz Nina, recordando as primeiras leituras, ainda o sonho de ter uma produção de chá em Vila do Conde se sedimentava. E quanto mais Nina e Dirk se informavam, mais difícil parecia. Portanto, só para a planta crescer, e até à colheita inaugural, seria preciso aguardar meia década — longínquo deadline para uma jornalista. Depois, da Camellia sinensis pode produzir-se chá branco, preto, amarelo, verde — qual escolher? O processo de transformação, concluíram, era bem mais complexo do que a simples secagem das folhas e todos os peritos garantiam que seria muito difícil cultivar camélias a partir de sementes. A juntar a isto, o facto de, além da Gorreana, nos Açores, não existirem grandes plantações de chá na Europa, muito menos no Litoral Norte português — em meados do século passado, houve um precursor em Ponte de Lima, que acabou por abandonar o projecto ao emigrar para o Brasil. Seria possível?

“Eu gosto de fazer coisas novas”, confessa Nina, “gosto da inovação, de fazer coisas que nunca ninguém fez”. Portanto,Nina, não gosta de “fazer coisas normais”, logo produzir chá em Vila do Conde parecia ser um desafio à medida. Deitou então mãos à obra, enquanto outros levavam as mãos à cabeça: “Muitas pessoas chamaram-nos, a mim e ao Dirk, mesmo loucos. Diziam ‘vocês agora avariaram completamente’. E eu pensei ‘talvez’. Mas se nós não arriscarmos, nunca mais vamos descobrir. A ideia é genial e vale a pena explorar.” A sorte foi que Haruyo e Shigeru Morimoto acharam o mesmo — e apadrinharam a plantação. Há 40 anos que os Morimoto produzem chá verde biológico numa ilha a sul do Japão, perto de Miyazaki. E quando Nina e Dirk estavam à procura de ajuda “de quem sabe” para semearem aquilo que viria a ser a Chá Camélia, lembraram-se de um lote que tinham provado numa loja na Alemanha — e foram dar a este casal japonês. “Vieram visitar-nos e logo abraçaram o projecto que, na altura, ainda era as 200 plantas na nossa relva”, graceja Nina. “E eles acharam tão giro!”

A MANEIRA JAPONESA DE FAZER AS COISAS

Tudo isso a fascina, por isso, promove worskshops e conversas sobre o tema — sempre com um brilhozinho nos olhos. Adora “a maneira japonesa de fazer as coisas direitinhas, com calma, com concentração”, o que “não significa ser rígido, mas sim fazer o correcto no momento”. Com “sensibilidade”. Também o design é simbólico. O lógotipo da Chá Camélia, desenhado por Regina Pessoa, é inspirado nos carimbos japoneses; as embalagens de madeira, sóbrias e simples, foram pensadas por Francisco Providência. Porque servir um chá não é apenas isso. A preparação, o local, o bule, a taça, não há nada que não tenha significado. “Isso é a cultura do chá: servir o máximo prazer no momento à pessoa que eu convido para uma taça de chá.” Antecipar as necessidades e servir o “chá perfeito” para quem o espera. Palavra de chajin.

“DOS MOMENTOS MAIS TERRÍVEIS DA MINHA VIDA.”

Em Fornelo, aonde a rede do telemóvel mal chega, há uma preciosidade escondida no barracão verde-água de portões vermelhos. À primeira vista, ninguém diria o que é aquela estrutura metálica a repousar num canto enegrecido. A mestre-de-cerimónias, felizmente, desfaz as dúvidas. “Esta é que é a famosa panela-wok”, apresenta. A história tem laivos trágicos. Quando visitou os Morimoto pela primeira vez no Japão, Nina recebeu de presente um wok, uma grande e pesada panela de ferro fundido, em que o casal tinha produzido o seu primeiro chá, há mais de 40 anos. Ficou radiante, claro. E trouxe a dádiva para Portugal, fazendo-se valer do seu japonês (para explicar tão estranha bagagem. Mas quando aterrou no Porto, ao fim de 36 horas de viagem, apercebeu-se que o wok tinha partido. “Chorei imenso, foi dos momentos mais terríveis da minha vida, porque era a primeira panela deles, o meu primeiro instrumento de produção”, lamenta. Dias depois, ainda a digerir a desilusão, encontrou alguém que, com “muita paciência”, fez um “milagre” ao soldar o triângulo em falta. “E ficou lindíssimo”, afirma, entusiasmada, para depois aludir à kintsugi, a arte japonesa de reparar com ouro fissuras na cerâmica. “Torna uma parte avariada, sem valor, numa coisa ainda mais valiosa, super especial”, descreve. “Como a nossa panela kintsugi.” Onde fazem o próprio chá.

PRODUTO INOVADOR E DISTINTIVO

Aqui, faz-se chá ao estilo asiático antigo. Porque, diz Nina, também é a “melhor maneira para a terra e para as plantas”. E esse esforço, acredita, está na taça que agora segura, no sabor de um “produto inovador e distintivo” que “revela muito a natureza”, um terroir muito próprio. A agricultura é biodinâmica, os processos são manuais, a produção é, orgulhosamente, pequena, até as cerâmicas são artesanais — tudo isso é devolvido no palato do Nosso Chá, assim se chama o primeiro chá verde da empresa. Nosso porque é obra de uma orquestra, não de um maestro.

“SABIA QUE ELA IA MUDAR A MINHA VIDA PARA SEMPRE.”

Assim chegou a Portugal, com a missão de fazer um trabalho sobre a vida no Douro para lá do vinho e da gastronomia, e alguém lhe indicou Dirk Niepoort como anfitrião. Ligou-lhe a medo, temia não perceber o seu português. Entre risos, recorda que no final do telefonema, “que não foi assim tão curto”, o interlocutor lhe disse: “Da próxima, podemos falar alemão.” “Oh my god, que vergonha”, reage ainda hoje. Já ele desligava a chamada com uma certeza: “Sabia que ela ia mudar a minha vida para sempre.” Apaixonaram-se. Nina mudou-se definitivamente para Portugal (“Porque as vinhas não se mudam”) — já tem, aliás, nacionalidade portuguesa. Viajaram, e viajam, muito (“E”, diz a sorrir, “sempre tem a ver com algo para beber ou comer”). Adoram o Japão, obviamente, e a Índia. E de andar de bicicleta ao fim-de-semana pela natureza.

“VAMOS VER, VAMOS TENTAR.”

Então, e agora? O que se segue? “Temos muitas ideias”, responde, prontamente, Nina. Já não surpreende. Primeiro, há que estabilizar a produção e aumentar, com parcimónia, a quantidade. Vão “brincar no mundo do chá verde”, com lotes especiais, cultivares diferentes, primeiras e segundas colheitas. Mais sonhos para Fornelo: construir uma réplica de uma casa de chá japonesa, um daqueles pavilhões simples e silenciosos, refúgio ideal para cerimónias de chá e degustações próximas da natureza; abrir uma oficina de cerâmica, promover workshops, convidar artistas e criar mesmo ali, ao lado da plantação, a louça ideal para o chá ideal. A longo prazo, experimentar o chá oolong. “É o meu segundo chá preferido, dizem que a produção ainda é mais complexa e demorada e que nunca é possível na Europa…” Soa a desafio? “Vamos ver, vamos tentar.” Claro que vão. Aguardemos. “Até chá”, como se diz por aqui.

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Soa a desafio? “Vamos ver, vamos tentar.” Claro que vão. Aguardemos. “Até chá”, como se diz por aqui.

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